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sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

DIA DO ÓRFÃO


MENINO – Jesus (sem, aparentemente, perceber a autorreferência)! Maria José: que dia é hoje?

MARIA JOSÉ – Ô, menino, hoje é dia do órfão.

JOSÉ – Meu Pai, Maria José, isso lá é jeito de falar com o menino? Por acaso ele não tem pai?

MARIA JOSÉ – Mas será o Benedito?

JOSÉ – Mulher, assim você me ofende. E olhe que eu te trato bem, como se fosse da família, quase como trato Maria.

MARIA JOSÉ – E eu por acaso sou algum José?

JOSÉ – Não. José sou eu. E se eu continuar com esse bate-boca com você, Maria José, vou acabar me sentindo um zé-mané.

MENINO – Maria José, o que é órfão?

MARIA JOSÉ – Vixe, Maria!

MENINO – Não xingue minha mãe, viu, Maria José.

MARIA JOSÉ – Meu Cristo! Eu só ia dizer: vixe, Maria, pergunte a teu pai.

MENINO – Eu já perguntei.

MARIA JOSÉ – E ele?

MENINO – Parece que não me ouve, sempre que Lhe pergunto.

MARIA JOSÉ – Que cruz!

JOSÉ – Que é isso, menino? Meu Jesus, desde quando eu não te dou ouvidos, meu filho?

MARIA JOSÉ – Acho, seu Zé, que o menino tava falando do outro Pai.

MARIA (chegando) – Que outro? Desde quando ele tem outro pai, mulher?

JOSÉ – É o que eu também quero saber.

MARIA JOSÉ – Cala-te boca: eu não disse nada.

MARIA – Disse sim.

MARIA JOSÉ – Não disse.

JOSÉ – Disse.

MARIA JOSÉ – Não disse

PEDRO – Alguém me chamou?

MARIA JOSÉ – (Esse pescador está atravessado em minha garganta; é uma pedra no meu sapato) Você tá chegando agora. Ouviu o galo cantar e não sabe onde.

MENINO – Afinal, alguém pode me explicar o que é um órfão?

MARIA – É só um menino (ou menina) que não tem pai.

JOSÉ – Nem mãe.

MENINO – Meu Pai do céu!

JOSÉ – Que foi que você disse, menino?

MARIA – O menino só falou por falar, homem.

JOSÉ – Menino, seu pai sou eu.

MENINO – Órfão!... Então hoje não é meu dia...

MARIA JOSÉ – Não, menino. Seu dia é amanhã. Eu até vou fazer um bolinho.

JOSÉ – E eu vou te dar um dinheirinho.

MARIA – A César o que é de César.

MENINO – Nada disso. O dinheiro é meu: e eu quero trinta moedas.

JOSÉ – Mas isso é traição.

MARIA JOSÉ – Já vi essa história. Você, menino, vai acabar não ganhando nada no seu dia.

MENINO – Prefiro a morte.

MARIA – Valha-me, Deus! Bata na boca, menino, que as palavras têm poder.

MARIA JOSÉ – E sangue de Cristo também.

JOSÉ – Calma, meu filho, isso são só palavras. Eu não vou deixar que te façam mal.

MENINO – O senhor me garante?

JOSÉ – Eu jamais vou te abandonar.

MENINO – Então, tá. Sabem o que eu queria ganhar? Um órfãozinho só para mim.

MARIA JOSÉ – Meu Redentor! Esse menino tem cada uma. E para que tu ia querer um órfãozinho, menino?

MENINO – Para brincar comigo: subir nas montanhas, derrubar as barracas dos mercadores lá no templo, colher azeitonas no Jardim das Oliveiras, andar nas águas, contar histórias...

JOSÉ – Esse menino é lavado, mas tem um bom coração.

MARIA – Puxou à mãe.

JOSÉ – Puxou ao pai.

MARIA JOSÉ – Mas se for bom demais, vão acabar crucificando o pobrezinho.

MENINO – Então, devo ser um pouquinho mal, pai?

JOSÉ – De jeito nenhum, meu filho.

MARIA JOSÉ – Mas fique esperto, menino, senão tu vai ao encontro do Pai mais cedo.

JOSÉ – Se você insistir nessas insinuações, te escorraço da minha casa.

MARIA JOSÉ (fingindo não ligar) – Ô, Madá, ô, Madalena, o peito percebeu...

MENINO – Afinal, e o meu órfão?

MARIA – Que tal todos os reinos da terra, em lugar desse seu órfãozinho?

MENINO – Não!

JOSÉ – E que tal todas as pessoas (inclusive todos os outros meninos) se ajoelhando diante de ti?

MENINO (hesitante) – Hum... Não!

MARIA JOSÉ – E pensar que esse menino já foi um cordeirinho. Agora, tá assim, respondão. Precisa de rédeas curtas: se eu fosse a mãe, mandava ele passar uns quarenta dias (e quarenta noites) lá no deserto, e sozinho.

MENINO – O diabo que ia.

MARIA JOSÉ – Vou lavar essa sua boca com vinagre.

MENINO – A conversa ainda não chegou na cozinha.

MARIA – Meu filho, o que é isso? Releve, Maria José: ele não sabe o que faz. E você, José, não diz nada?

JOSÉ – Eu, hein! Quem pariu Mateus que embalance. Tenho mais o que fazer. Tenho uma mesa com quatro cadeiras para entregar. E bem que esse menino podia me ajudar.

MARIA – Não! A missão dele é muito maior. Ele ainda vai salvar o mundo.

MARIA JOSÉ – Credo, seu Zé, dona Maria já não tá dizendo coisa com coisa.

MARIA – Esperem e verão.

MENINO – Esperem: já é verão. Tô de férias. Vou brincar de subir correndo o Calvário.

MARIA – Sozinho não.

MENINO – Eu vou com Simão.

MARIA – Que Simão?

MENINO – O cireneu.

MARIA JOSÉ – Ah, bom! Vá, meu menino. Mas cuidado com os espinhos, ou amanhã não tem festa.

Rindo, todos admiram a ingenuidade das crianças.

CHICO VIVAS

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segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

DIA DO MARINHEIRO


Persegue o marinheiro, mesmo que não deva nada a ninguém, como um mítico monstro do mar de comprovada existência, ao menos enquanto mito que é, não se lhe podendo cobrar, por indevido que é, que apresente documentos oficiais – e uma foto três-por-quatro não daria dele uma boa impressão, reduzindo-o a um detalhe, quando o que o faz ser tão monstruoso assim é justamente não caber em tão estreita moldura -, a (própria) solidão: se não fosse um casamento impossível, se diria um par perfeito, tão ao gosto, essas idealizações, do casamento.

É coisa que desconheço saber se alguém escolhe – se escolhe, ser marinheiro porque, sem par talvez, desiludido com os “ideais” que, com o tempo (com a água que sempre passa por debaixo da ponte), já se sentia atraído pela solidão, embora o mar não seja sua única morada, solidão que não escolhe lugar, indo desde, aparentemente humilde, uma casa que mal se sustenta em pé, ainda que nesse caso se tenham preocupações mais urgentes, o que requer os pés no chão, do que com a (própria) solidão, até uma casa com a qual, ainda aparentemente, nenhuma outra está em pé...de igualdade, ou se, lançado ao mar, como alguém que atira para todos os lados, por falta de outra opção, sabendo quão difícil, a partir de então, se tornará lançar âncora nalgum lugar, mesmo que esse seja justamente um dos trabalhos de todo marinheiro: mas isso é mais literal, tempo suficiente para se atracar momentaneamente, alçando-se-a logo depois, ainda pela força dos seus mesmos braços.

Sem pouso certo, é ave do mar que vive com lembranças da terra, com a típica insatisfação humana que faz, aves mais afeitas aos terrenos sólidos, sentir nostalgia do mar, mesmo de um que nunca conheceu, mesmo uma ave que jamais sobrevoou qualquer mar.

Havendo portos em que deve obrigatoriamente parar, salta aos olhos a avidez do marinheiro por se afastar da solidão, sem sequer o cuidado de, ao agir assim, tão afoito, deixá-la (sozinha, claro) a ver navios, sendo isso o que, em tais circunstâncias, é “só” o que ela pode ver. Afastando-se dela, busca, como se ele próprio fosse uma âncora, lançar-se em outros braços: e age como se fosse sua única opção, embora possa escolher os braços, não diferindo, no entanto, uns dos outros, até, nesse seu mergulho em terra firme, afundando o máximo que pode, com alguma certeza, dada pelo ir e vir da mesma âncora nos mares profundos, que de lá emergirá renovado, apesar do o mesmo ainda (ou outro homem, apesar do mesmo marinheiro de sempre), para, de novo, como sina a cumprir, zarpando, ir encontrar (sua eterna) solidão.

E sequer, nessa união, sem a alternativa do sim ou não, pode se vangloriar (e nisso, tem os pés no chão) da exclusividade que a solidão lhe devota, haja vista, ainda que possa assumir faces diversas, ser a mesma solidão que ora se lança, como esposa que perdoou as escapadas do esposo, em quaisquer braços, ora como a demonstrar certo desinteresse, tal qual soubesse que, por mais que falem mal dela, espera que se lancem, marinheiros quaisquer, em seus braços.

Talvez tudo isso seja muito, e a solidão só exista na (minha?) fantasia.

Como eternos marinheiros de primeira viagem apesar dos tantos portos, a ponto de já ficarmos enjoados com essa onda toda, fugimos da solidão, sabendo que em algum cais ela nos encontrará, ou então, sabendo o quanto isso pode significar um naufrágio, eventualmente sem solução, lançamo-nos em seus braços.

E é só.

CHICO VIVAS

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sábado, 4 de dezembro de 2010

DIA MUNDIAL DA PROPAGANDA





Se for mesmo verdade, e não propaganda (de si mesma) enganosa, que ela própria, a propaganda, é a alma do negócio, sendo a propaganda também um negócio à parte, terá alma ou será, segundo certa contrapropaganda, completamente desalmada, talvez assim não por ser o que é simplesmente, mas por fazer propaganda de negócios outros em que não entram, por princípio, tendo como objetivo, esse fim tão almejado, o lucro, sentimentos que mais facilmente se associam à alma, deixando ao corpo, supondo-o (com garantias científicas) perecível, os “maus”.
A alma, sem entrar em detalhes conceituais que escapariam, qual areia teimosa, contrária a sua prisão em nossas mãos, por entre os dedos, sabe-se, é o “negócio” da psicologia: e acrescentar, aqui, que se fala de alma humana, ou é sentimentalismo exagerado que tende, eventualmente com “aspas covardes”, a atribuir a outros animais uma alma igualmente, até atribuindo-lhes, levando esse mesmo sentimentalismo ao seu rimado paroxismo, uma alma bem melhor que a dos homens, na hipótese de ela existir de verdade e não ser mero esforço, bem-sucedido, de alguma propaganda, ou então é, conhecendo-nos, sabendo do que nos vai nessa dita alma (bendita ou maldita, a depender do humor da hora), a tentativa, bem humana, algo covarde, de partilhar, a sua própria revelia, com outros (animais) o que seria da nossa inteira responsabilidade.
E não podemos nos esquecer – por Deus que não! – que essa alma, mesmo que olhada sob outra perspectiva, ainda que pelos mesmos olhos humanos (talvez já não tão demasiadamente assim), é, se não uso mal a palavra, o objeto das religiões, sendo, não raro, sem o temor de não usar bem a palavra, seu mais lucrativo negócio: e aí, em que pesem algumas divergências, entre infantis e ecológico-preservativas, nessa “festa no céu”, outros animais não entram, provavelmente por conta dessa “sapiência” humana a respeito do quinhão de cada um, ainda quando se acena com latifúndios a perder de vista; por definição, intermináveis.
Sendo a propaganda a alma do negócio, psicologia e religião não passam de mera propaganda (de si mesmas), não precisando, portanto, salvo algum “engano”, de propaganda, alimentando-a assim como negócio próprio ou, havendo psicologias tantas (até animais), religiões ainda mais (para todos os gostos, dos mais “racionais” até os que fazem da irracionalidade seu maior trunfo), torna-se mais imperioso, dada a concorrência num mercado que, não sendo o paraíso, não tem lugar para todos “igualmente”, que se lance mão da propaganda?
Como se vê, respostas não são o meu forte.

CHICO VIVAS

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segunda-feira, 29 de novembro de 2010

DIA DO CAFÉ


Os que não o aceitam puro, contrariando, curiosamente, o gosto dos puristas, usam, numa repetição sem graça ou apenas como um gracejo nada original, o argumento de que de amarga a vida já é suficiente, não sendo, portanto, mais necessário que se lhe acrescente, nem que seja somente uma colherinha, mais algum amargor: e é assim que o café sucumbe ao açúcar, embora, como náufrago que não encontrou uma tábua de salvação a tempo e, pesado ainda, de início, todo o açúcar vá para o fundo, e só depois, com a intervenção da colher(inha ou não), agindo então já não como medida, e sim como um remo a remexer aquelas águas, entre mornas e quentes, é que, afinal, se dissolve todo, desaparecendo em corpo, permanecendo, porém, e de modo marcante, mesmo que nem sempre se dê por ele, em espírito, com sua indisfarçável doçura, fazendo com que, não raro, o café forte, de personalidade, seja confundido com um doce qualquer.


Café não deveria admitir diminutivo, já que cafezinho(s) são como lugares-comuns (como o de que de amargo já basta a vida, mesmo que, eventualmente, isso seja uma verdade, e nem tão incomum assim) que, ditos ou bebidos, são consumidos por hábito, sem que se lhes perceba, nos lugares-comuns, esse seu caráter que os impede de ter significados mais ricos, atados ao que o uso lhes impôs, ou não se percebe nesses constantes cafezinhos o gosto do próprio café – seja um em que o amargo natural assume preponderância, seja um, o que é mais comum na maioria dos lugares, que já se associou ao açúcar.


O bom café requer temperatura ideal, sem o preciosismo de se contar a quantidade exata de borbulhas que o calor faz brotar na água, sem o requinte (requentado, para os conhecedores, nem pensar!) de um termômetro específico para esses mergulhos: a boa temperatura para o café é aquela que não exige sopros – como alguém que gasta muito tempo se enfeitando para sair e, na hora de passar pela porta, gasta outro tanto, ao se ver, de relance, nalgum espelho, tirando os enfeites -, mas que também não permite que se o sorva de um só gole. Tomá-lo aos poucos estimula alguma reflexão, e não tanto por suas propriedades estimulantes, capazes de excitar a memória, sem garantias de que desse ato reflexivo surjam pensamentos originais, podendo mesmo ser que, de tanto pensar, se chegue à conclusão de que, muito doce então, se deveria experimentar um café mais “puro” ou de que, de tão amargo, têm razão os que atribuem à vida toda a cota de amargura, não sendo preciso nem uma colher(inha) a mais.


Embora recomendável – quando não se tem restrições em sentido contrário -, o café-da-manhã é outra história: é só refeição matinal em que nem sempre entra o café que lhe dá nome; e mesmo que esteja aí presente, além da força nada desprezível do hábito, é uma necessidade da hora. O café, sem os mesmos valores aristocráticos (ou “simplesmente” esnobes) do vinho (muitos, embora escondam isso, preferem os mais adocicados), pede alguma exclusividade, certo estar-a-sós, nada de “acompanhamentos”, a menos que, já demasiada amarga a vida, não se lhe possa mais somar nem uma gota de solidão, sob o risco de se afundar, cada vez mais, em lamúrias acres.

CHICO VIVAS

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domingo, 21 de novembro de 2010

DIA DAS SAUDAÇÕES


Olá, como vai?! Eu vou indo. E você, conhece, além desta, com um repertório mais variado que o meu, outras formas de saudação? E por que eu quero saber, se mal não há em sempre se saudar assim, já sendo, em si, a disposição para se saudar alguém um ato suficientemente “rico”, dispensável então que se fique, por preciosismo ou por temor de parecer repetitivo, a procurar outras fórmulas, arriscando-se até, nessa busca incessante por originalidade(s), esbarrar, com os danos típicos de um encontrão assim, em bizarrices?

É que hoje é o dia das saudações. E se as usamos, costumeiramente, para saudar, para “nos saudar”, para saudar o dia (de hoje), para fazê-lo em relação a um dia especial, para, enfim, saudar alguém que se inclui no dia que se quer saudar, nada mais justo que saudar este dia, das saudações que é.

Talvez quem inventou este dia não tivesse a intenção de que nos puséssemos a saudá-lo: o dia e não seu próprio inventor, já que assim estaria legislando, se foi um legislador quem isso inventou, em causa própria. Quem sabe se não o fez, bem-intencionado, apesar deste dia, de tão pouco conhecido, ser quase ignorado, para nos lembrar da “cordialidade” (essa palavra que sai do “coração”: e isso eu sei “de cor”) que há em se saudar alguém?

Pode-se especular se as saudações, tornadas fórmulas convencionais, convencionado que ficou que se as deve usar, não se transformaram em meras palavras, lugares-comuns que são usados sem a plena consciência do ato (de cordialidade) que elas encerram. Pouco importa, na verdade. Saudar alguém, mesmo que respondendo a uma convenção, ainda que isso não expresse, rigorosamente, um desejo do coração, abre espaço, por menor que seja (para quem vive na escuridão doméstica, uma frecha, como uma brecha nesse breu, é um alvissareiro sinal de luz; e para quem está mergulhado no escuro “temporal”, a céu aberto (ou fechado), em alguns lugares, em dada época do ano, um raiozinho de sol, tímido ainda, é bastante para antecipar o calor (arrepiante) a vir), para, pergunta feita com jeito de afirmação – olá, como vai?! -, resposta lhe seja dada, sem “precisão”: eu vou bem, eu vou indo (para onde?), e você?

Mas, se a intenção (das boas) é saudar o dia, dia das saudações, e o dia (como alguém que, em mau dia, recebendo saudação, passa batido, mesmo sem saber para onde vai, e não a responde, ou só murmura, inaudível então, um “eu vou indo”, entredentes) não sabe como responder, saudá-lo, então, para quê?

Isso eu não sei dizer. A pergunta deveria ser feita e quem inventou este dia: este, porém, eu não sei quem é. Mas, presumo que o dia – o de hoje, em especial, e qualquer outro – já se sentirá devidamente saudado se, dirigindo-nos a alguém, mesmo na pressa que nos faz passar batido pelo dias, lançarmos-lhe um “olá, como vai?!”

Lançado está!

CHICO VIVAS

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quarta-feira, 10 de novembro de 2010

DIA DO TRIGO


Quem come pão nem pensa - sendo de sal ou mesmo sendo outro, que o sal sempre entra de alguma forma – que aquilo que o tempera, tirando-lhe um, se não insuportável, não-apreciado insosso, vem do suor, já naturalmente temperado assim, embora o suor seja mais visível nos trópicos acalorados do que em regiões, ironicamente, mais temperadas, vindo não de uma exsudação espontânea, resultado previsível e mesmo desejado do bom funcionamento da nossa fisiologia sistêmica, ou daquele hábito, bem me voga, dos esforços calculados, cronometrados até, seja em nome de uma boa saúde, qualidade de vida como muitos preferem dizer, embora, se pudessem escolher, nem sempre com alternativas à mão, se deixassem seduzir pelos encantos numéricos da mera quantidade (inclusive por acreditarem que com mais tempo, mais chances haveria de se tratar...da qualidade, ainda em vida), ou seja tão-só porque comer faz bem à imagem, especialmente quando, vivendo às correrias, mostra-se ainda com tempo para isso.

O suor que dá o tom ao pão (que vem, classicamente, do trigo, ainda que outras variações, ao longo do tempo, tenham surgido, sem o mesmo apelo, a ponto de, sendo de outra matéria-prima, juntar-se-lhes, nem que seja um tantinho, o trigo) vem do trabalho árduo e incessante de um homem que, primeiro em tudo, legou a sua descendência essa exaustiva herança, ele próprio um Tântalo, condenado a viver assim, de comer(?) o que a todo instante parece lhe fugir das mãos, amargando a culpa original, por mais que hoje não haja qualquer originalidade em se falar em culpa, recorrendo a ela até os inocentes, os que não sabem como se ganha o pão, não lhes passando pela cabeça que uma máquina (de fazer pão: mesmo que metáfora – ou eufemismo – para não se falar do esforço humano) possa suar: mais sensato foi Brás Cubas que, bem orientado por seu mentor, não à toa um Bruxo que já parece ter nascido de barbas brancas, não legou a própria miséria a sua descendência, uma miséria, aliás, mais filosófica, moral, do que propriamente a carência de bens, que ele tinha demais, se se considerar sua solidão.

Mas, não é à toa também que o Criador de Machado de Assis é Quem é: numa tacada de mestre (mesmo que isso não Lhe tenha saído da cabeça, autorizado, porém, Biografado com sumo poder de veto), inventou mais do que pão: inventou tudo, afinal. Inventou, sobretudo, o pão como imagem do alimento maior, ainda que um pão menor, um pãozinho até, e não apenas para suprir, com seus carboidratos, as necessidades dos músculos, exigidos em esforços constantes, compulsórios ou por livre vontade, ao ar livre ou em ambientes fechados (a poucos ou a muitos, a depender do preço), mas para alimentar, figuradamente, o espírito que, para marcar sua aparente(!) superioridade em relação ao corpo, sequer precisa de alimento – ou, se precisa, é de um de gênero inefável, por mais que se gastem tantas palavras para dizê-lo.

Motivo de preocupação: o pão de cada dia, expressão que substitui um desejado cardápio variado – ou, na falta, o mesmo, repetido, e, em último caso, o pão propriamente dito. E ainda preocupa o pão, por mais que seja constrangedor se falar assim, de barriga cheia, por seu potencial de energia que, não gasta (talvez em ganhar com suar o pão de cada dia), acumula-se: e justamente onde, senão na barriga, cada vez mais com aquela sua indesejada aparência de “cheia”.

Será que o castigo não poderia ter sido viver quebrando galho, tentando alcançar, como Tântalo, a copa da árvore para nos alimentar de...maçã: que, sabidamente, enche a barriga sem exibi-la tão “cheia”?

CHICO VIVAS

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segunda-feira, 1 de novembro de 2010

DIA DE FINADOS





Alheios a serem “colhidos” pela minha mão, os ciprestes se deixam plantar no chão, à espera do tempo e das condições ideais para medrarem - e, aqui, quase não resisto à tentação, tão mais baixo do que um deles, mesmo dos ainda muito jovens, pode chegar, de, com os joguinhos habituais, dizer deles: se...prestes. Mas, contenho estes meus dedos lúdicos, ávidos, e não lhes permito que brinquem assim, com algo tão sério, apesar de, ao plantar tais ciprestes neste solo virtual, abrir espaço, qual sulco na terra, para que me tomem por um brincalhão ou por quem não tem mais nada o que fazer, como se as brincadeiras só entrassem nas histórias no vácuo das seriedades ausentes, e não fossem tão essenciais (ao crescimento, o nosso e não o dos ciprestes) quanto é o desenvolvimento da mão, mesmo que suas linhas não se desenrolem, de inextricável por destino próprio, numa sequência de palavras legíveis, a ponto de não deixarem margem alguma quanto ao futuro que nos aguarda.

E que futuro nos aguarda, senão (e temo que a brincadeira comece a ficar demasiado séria) o cemitério, o campo onde reverdecem lembranças protocolares e histórias em processo de esquecimento, onde medram campas com palavras tão sérias para a finitude do homem, que beiram já a brincadeira?

Árvore comum em lugares assim, dito santos lugares e onde se encontram toda sorte de homens, os que tiveram sorte na vida e os que a única sorte(?) que tiveram na vida foi a de serem homens, os ciprestes têm a peculiaridade de sempre se mostrarem verdes: eis aí, se não uma boa desculpa para esse assunto ter entrado aqui, ao menos, uma esperança de que, com ou sem jogos de palavras, eu consiga sair desse lugar, sem ainda nele ter dado entrada, ascendendo à vida, essa mesma cotidiana, ainda que isso signifique “descer” às suas vias públicas demais, a alguma depressão na topografia e a certas baixezas que não se trocam, em vida, pelas alturas prometidas por um futuro de ciprestes, inexorável, mesmo que se descreia deles por escrito ou que, viva, a voz grite contra tais desígnios.

O cipreste que planto aqui não foi arrancado a um campo-para-sempre, mas à fantasia em que, plantado, como se diria de certa terra que conhecemos, tudo dá, inclusive coníferas assim. E se planto, transplantando-o, em palavras, da imaginação não necessariamente fértil (apesar de, em certas estações, abundarem - e o jogo de palavras é inevitável - adubos naturais), faço-o não pela paisagem que costuma abrigá-lo, mas pelo verde que teima em lhe ser única cor, como se, insurgindo-se contra o outono que toda vida conhece, conhecendo-os até em ciclos que se repetem, até que a roda finalmente se feche, gritasse que vive para sempre, sem talvez perceber que mesmo num verde insistente há sutis variações, fazendo de certo tom, que nos homens é já marrom, tendência de moda outonal.

Então, numa tentativa de “subirmos aos baixos” a que tanto nos apegamos, ainda que clamemos aos céus por uma vida mais elevada, faço dessa plantação de ciprestes uma coleção de lembranças, todas elas perenemente verdes, independentemente do tempo em que foram deitadas ao chão, acomodando-se dentro da terra, que é o jeito característico, ao contrário do homem, de uma planta vir a nascer: sei que há algumas de um verde-bebê, tenros ciprestes que já se lançam ao espaço, prontas para crescerem, e outras lembranças que, aos meus olhos, serão sempre verdes, ainda que grassem por aí um tom de verde-maduro.

Entre o olhar decidido as lembranças jovens e o não querer ver que há as que, jovens um dia, foram empurradas para um indiscernível tom de marrom, há ainda as lembranças que passeiam entre um extremo e outro.

CHICO VIVAS
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segunda-feira, 25 de outubro de 2010

DIA DA DEMOCRACIA


A democracia, aprendemos, em idade em que talvez prezemos mais nossa própria tirania, valendo-nos, inclusive, do que as sociedades democráticas constituíram como valores fundamentais, qual seja, um deles, o respeito à dignidade humana, especialmente daqueles que (ainda, supostamente) não sabem se defender, é, pois, o “poder do povo, pelo povo, para o povo” – e raramente quem assim nos ensina se mostra democrático o bastante para admitir discordâncias; e se o permite, faz isso com um condescendente olhar tirânico (porque, não nos deixemos enganar, tanto os tiranos sabem, a seu bel-prazer, ser condescendentes, nem que seja para descansarem um pouco de tanta tirania, quanto os condescendentes, por natureza, sempre tão dispostos a se deixarem convencer pela vontade alheia, sabem ser tirânicos, usando para isso, às vezes, por ser um disfarce seguro (para própria) condescendência).

O poder pode. E, tautologia à parte, pode mesmo. Pode tanto o poder que “pode”, acordo aqui, acordo acolá, não perdeu nada do seu poder, mantendo-se diferenciado de “pôde”, que, apesar de evidente passado, continua podendo, não se lhe tendo tirado nada.

O poder para o povo. Apesar das consultas protocolares, a sensação que se tem é de que o povo, se quisesse, com todo o poder que lhe é atribuído numa democracia, nada poderia, a tal ponto que ao se falar em o poder “para” o povo, pode-se, por ingenuidade sincera ou por chicana muito bem estudada, se manter em dúvida a respeito: tal poder dirige-se ao povo, portando (é) para ele, ou o para, imobilizando-o? – e vejam que “para”, sem tanto poder, pardo ou em movimento, perdeu assento no trem da diferenciação.

Já longe (de mim distante) o povo (na verdade, belos aristocratas) falando por si mesmo, exercendo diretamente o poder que é seu, sem intermediários – e sabemos o quanto os intermediários costumam encarecer o “negócio” -, temos de nos contentar, algo condescendentemente, com uma democracia representativa, em que o poder é exercido em nosso nome, “pelo povo”. E “pelo”, como se lhe tivessem arrancado os cabelos que demarcavam a diferença ente si e um “pelo” naturalmente careca, assemelha-se agora a um “para” que não se sabe muito bem para onde vai, ou mesmo se vai, porque esse para pode (e ele tem poder para isso) ser uma ordem, imperativo que é, quase tirânica, para (como fugir disso?) que não se vá adiante.

E nós, democratas, para onde vamos?

Vamo-nos acostumando ao para sem acento que nos ordena que paremos; a um para que, vendo-nos parando imediatamente (nunca se sabe se tal ordem partiu de um tirano sem condescendência), diz-nos, condescendentemente, que não, que não temos de parar, e que ele só queria mesmo (nos) indicar uma direção. Não menos acostumados vamos ficando com um pelo (e um só, como se fosse um tirano, por vezes, já é suficiente para nos irritar), quando não há sinal de cabelo algum, e um outro (pelo) que fala em nome de terceiros.

Se democracia é isso, só de pensar no que seja uma (boa?) tirania, eu me “pelo” de medo.

CHICO VIVAS

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segunda-feira, 18 de outubro de 2010

DIA DO MÉDICO



Há os (que são) “de alma”: e o mais conhecido deles é (o também evangelista) Lucas. Mas, para quem sofre na pele (mesmo que não seja uma doença dermatológica) as dores da carne, muitas destas com origem presumida justamente na alma, embora haja os que considerem tal diagnóstico mais poesia do que propriamente medicina, médicos devem se ater, concentrando toda sua atenção científica, em nos curar; em, ao menos, fazer cessar os sintomas mais dolorosos, por mais que saibamos que sob o efeito analgésico de alívio imediato jazem, vivos, tantos males: e, nesse caso, sequer nos importamos que o médico seja “encantador” ou não, desde que, como que por encanto, espécie então de herói mítico que vem em nosso socorro, salve-nos. E daí que eles não nos possam salvar para sempre, ad nauseum?

Pensa-se comumente que o “encanto” da medicina (sem se perceber, está-se reaproximando uma ciência de hoje, embora já o seja há muito, de uma magia de outrora) esteja em salvar vidas, quando, por menos poético que isso pareça, ela tão-só a conserva, até certo limite, por mais duro que seja admitir isso, inclusive porque ao se ultrapassar limites estabelecidos por uma série histórica da qual se obteve uma média, tangencia-se o milagre: este bem mais ao gosto dos médicos de alma.

Não sei se com dores incuráveis (todas, no fundo, mesmo que tenhamos a impressão de que sofremos à flor da pele, o são), com olhos já voltados para a “possibilidade” de um milagre, alguns se perguntam – às vezes, perguntando-se alto o suficiente para que isso surja como um questionamento geral – de que valem as curas ou os alívios para o corpo, se na alma se cultiva uma chaga que não se fecha, que, se se fecha, não cicatriza, sendo isso uma porta aberta para nunca se fechar de verdade, sendo, portanto, se não de maior importância, igualmente relevante que se trate dela, dessa alma, ao mesmo tempo em que nos voltamos para o corpo, nós que tanto gostamos de, fixamente, olhar para o próprio umbigo: e este não passa de uma “cicatriz” (provavelmente, a primeira de todas as que virão), apesar de tecnicamente fechada a “ferida”, eternamente escancarada porta de entrada para as nossas humanas vaidades.

Das muitas especulações que o tema pode nos sugerir, uma, talvez óbvia até, mas nem por isso menos curiosa, é a de que os próprios médicos, detentores, na nossa louca esperança de cura, do mistério do nosso bem-estar prolongado, eles mesmos sofram – na pele, na carne, na alma. Na (nossa) fantasia mais corriqueira, quem sabe como fazer (o) bem a outro sabe também dirigi-lo, esse mesmo bem, para si, ou se não o pode, como então confiar em que o que fazem a outro(s) é bom, é bem-feito?

Tudo fantasia! Necessidade humana de acreditarmos num salvamento, venha este de Deus – Médico dos médicos – ou venha de uma língua latina, um Deus ex-machina, figura teatral nascida de mesma língua de Hipócrates (e que para mim continua sendo grego).

Ars longa vita brevis! Sinal dos tempos: a vida breve, hoje, “vive” mais que a mais longa das artes – “plásticas”. Eis aí, para muitos, o nome da milagrosa cura para o maior mal que parece lhes afligir: o passar do tempo.


CHICO VIVAS

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sexta-feira, 15 de outubro de 2010

DIA DE SANTA TEREZA DE ÁVILA




Eis uma dessas contradições que a arte fomenta, mesmo sem querer – embora alguns “queiram” que a verdadeira arte não quer só o que diz (o que diz querer com aquilo que mostra), querendo também através daquilo que permanece escondido, visível, às vezes, num relance, pela intervenção do observador, que nem se dá conta daquilo que então vê, mas se deixa capturar por alguma instância de sua (in)(sub)consciência –, criando um choque que se sente, ainda que não se acuse nenhum golpe correspondente: quão diferente “é” a Tereza de Ávila humana, mesmo quando já ostenta, com supostamente perdida humanidade, um “santa” à frente do seu nome primeiro, seguido de um toponímico que nem sempre revela sua Espanha natal, daquela outra, trocada a carne morna, à temperatura dos homens (sem que se lhe queira, assim, emprestar os graus elevados da paixão do corpo) pela pedra fria que a arte de Bernini “esquenta”, com todo seu panejamento de dobras vivas e sua profusão de detalhes tipicamente barrocos, numa provocação aos nossos sentidos, provocando um êxtase do qual não sei dizer se aquém do místico experimentado pela própria Tereza ou se além, assim porque um êxtase que, percebido no corpo, eleva(-nos) para algo que, na falta de outra palavra, chamamos de...alma.



E aquela santa, espírito inteiramente, cutuca-nos ao ser “fotografada” assim, no exato instante em que, por obra e graça de um Espírito que conhece muito bem o ponto fraco da carne (se não for toda ela assim), tem seu peito, coração já na boca, trespassado por uma flecha de ouro, incandescente metal, fazendo nascer nela uma sensação (de prazer) jamais vivida, virgem diplomada, doutora por uma causa.



Como há muito louco (já não tão “varridos”, por causa de uma política que não os quer mais segregados em manicômios, segregando-os, de qualquer modo, do lado de fora) que justifica (e se é capaz de se justificar, “normalmente” apto para avaliar a necessidade de uma justificativa, nem deve ser tão louco assim) seus atos chamando em seu socorro (minha Nossa Senhora!) um misticismo que não requer provas testemunhais, os místicos “de verdade” (sem apresentarem testemunhas), muitas vezes, são tratados como loucos quaisquer.



Tereza tinha visões que outros olhos não viam – talvez porque visse com outros olhos que os outros não tinham – e dialogava com o céu, encontrando nele um interlocutor paciente, a ponto de lhe permitir anotar essas conversas.



Louca, Tereza?



Louco “é” Bernini, pois, se não era (um) místico, só loucura justifica tanta arte. Loucos somos nós quando, diante da pedra esculpida, não nos permitimos, por razões laicas, experimentar o êxtase de tantas curvas numa só mulher. E loucos seremos ainda mais quando, vendo Tereza assim, conseguirmos enxergar o que ora parece tão escondido, embora nunca tenha saído do seu lugar, e ora tão à mostra que queremos nos esconder por não termos visto aquilo antes, à cara como nos surge. Louco, enfim, sou eu que escrevo como um barroco, causando tonturas, mas êxtase que é bom...



CHICO VIVAS
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DIA DO PROFESSOR


Ser professor, respeitada a questão de gênero, não é de hoje, deixou de povoar o imaginário, salvo, talvez, em crianças em idade pré-escolar e que encontram na escola (e no professor), na qual são recém-chegados, suas primeiras relações de sociabilidade, deixada ora de lado as relações com a própria família, sem mais tempo para nada, reclamando, inclusive, sem citar os filhos, que há muito sequer têm (os pais) vida social, saudosos todos, provavelmente, das delícias(!) mundanas dos fins de semana sem preocupações maiores senão consigo mesmo.


Não deixa de ser curioso ver aqueles marmanjos – até os nem tanto, quase meninos ainda em idade pré-escolar, assumem, pelo físico potente requerido pela atividade profissional, cara assim – se referindo, jogadores de futebol que são, ao técnico como “Professor”: e muitos destes são ex-jogadores que não tiveram tempo ou oportunidade (ou mesmo ambas as coisas, aliadas a alguma falta de vontade) para estudar e que se veem hierarquicamente alçados a tal condição. Na verdade, o título, eventualmente sem o mérito respectivo, revela nada além de uma pouco sincera submissão, uma não mais honesta civilidade (frente às câmeras): e submissão, um dia requisito pedagógico, mesmo que hoje insincera, é o que professores em geral menos encontram; e que dizer da civilidade, ainda que só para manter as aparências!?


Se esse “Professor” fosse um reconhecimento, por menos acadêmico, das qualidades, num autodidatismo respeitável, de alguém, se veriam outras categorias a usá-lo, sempre dirigindo-o ao dono de um notório saber, sem a preocupação bajulatória de endereçá-lo sempre a um superior(?), enfatizando mais o termo quanto menos esse superior tenha alisado os bancos da escola (dada a evasão, cada vez mais ásperos os bancos), como se o saber adquirido com esforço, sobre os livros, com ouvidos atentos para o professor, até, com o tempo, para se aprender a contestá-lo com cortês assertividade, não fosse tão louvável quanto qualquer conhecimento apreendido com a prática, quando esta vai ao encontro de um talento nato ou de uma vocação persistente, não se excluindo, embora rara mais e mais, a conjunção de talento e vocação.


É sintomático que, como reconhecimento do talento, saber notório, indiscutível vocação, um cantor tenha ganho, com essa informalidade que prescinde do capelo, toga e diploma com letras góticas, o título de “Professor”. Mas, quem ainda conhece Cauby Peixoto? E se (o) ouviu (falar), acha tudo aquilo muito antiquado, do tempo em que se “alisavam os bancos da escola”, do tempo em que se reconhecia, com lampejos saudáveis de rebeldia contra a ordem estabelecida, a cadeia hierárquica, do tempo em que professor e aluno não eram caso de polícia.


Aliás, quem ainda sonha, sem a pressão de um mercado de trabalho cada vez mais estreito, em ser policial? Mesmo assim, reconhecendo-o com força (bruta, às vezes), apesar da baixa patente, como jogadores querendo parecer educados diante de um técnico nem sempre assim, tratam “o polícia” por um civil “chefia” ou por um (talvez mais apropriado) militar “general”, “coronel”, “capitão”, batendo-lhe continência.


CHICO VIVAS


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terça-feira, 12 de outubro de 2010

DIA DO MAR


Sem que se o associe, deixando em aberto, como uma trilha bíblica ainda não fechada, a possibilidade de que se trate de qualquer mar, vivo ou morto, seja um poeticamente azul, com inspiração celestial, seja vermelho esse mar, independentemente das bélicas histórias de que tenha sido testemunha, nem sempre silencioso, embora seus característicos rumores, talvez por irem e virem, numa pusilanimidade indisfarçável, não sejam suficientes para despertar os pacíficos sonolentos ou para adormecer (ainda que isto seja mais fácil do que aquilo) os que só põem sua bravura a serviço das batalhas, o mar, portanto, guarda muitos mistérios: e, provavelmente, o maior deles seja decidir quem os pôs ali.

E nem todo mistério é uma fortuna em potencial; nem todo enigma, mesmo quando solucionado, garante as soluções tão desejadas, podendo mesmo, como se se comportasse como uma boneca russa, trazer em si um enigma menor, menor em tamanho, para que pudesse ter cabido ali, seu continente então, e não porque seja um enigma de mais fácil solução, num crescendo de mistério inversamente proporcional ao decréscimo do tamanho. Assim, nem tudo que se acha – já achado ou ainda lá, à espera disso, sob o nosso ponto de vista – no fundo do mar é um verdadeiro mistério, podendo inclusive não passar de puro lixo, espécie de enigmas produzidos em série, sem critérios, sem controle de qualidade, impressos em papel impossível de ser reciclado, e só para assim atender a uma demanda voraz.

No fundo, nem tudo é mesmo mistério; é só nossa fantasia de acreditar que por trás de todas as coisas há uma grande revelação, desmerecendo as aparências em favor da coisa em si, ainda que, na prática, não se despreze, à parte a intensidade da fome, a polpa suculenta que o envolve, indo-se, direta e avidamente, ao caroço – a menos que se tome a casca, por mais fina, a ponto de se a confundir com a fruta em si, como a aparência, promovendo a carne da fruta ao em si, ficando o tal caroço, semente que é, para outras divagações: semânticas, quem sabe.

Do muito que se tem lançado ao mar, nada supera o olhar, os muitos olhares. E os olhos não se contentam em, simplesmente, ali se lançarem, boiando, como um corpo despreocupado que se deixa levar, ao sabor dos acordos tácitos firmados entre ondas e vento (embora se possa confundir corpo assim com um outro, náufrago a boiar, sem gozo desse flutuar, ainda à mercê das ondas, dos desígnios dos ventos). Quer-se emprestar ao mar um sentido todo próprio, ora enxergando-o, por menos fundo que se vá, como representação mais à mão (mais ao pé, embora não da letra, longe disso até) da eternidade do que o céu, ora como síntese de todos os mistérios do mundo, esconderijo de todos os projetos, com ou sem fundamento, que vierem a afundar.

Já sem terras disponíveis, nos lançamos ao mar, dizendo que a vida na terra não está para peixe, competindo com os próprios peixes nessa disputa por mar. E não percebemos que, como um qualquer, engolimos a isca e somos fisgados por um mistério sem solução, mas que nos vai dando pistas, alimentando em nós a ilusão de que, persistindo, haveremos de lá chegar, incapazes que nos tornamos de, nesse ponto, nos dar conta de que “lá”, por si, já é um enigma indecifrável.

Que muitos se joguem, não só de corpo, às vezes, de alma também – é a sua alma, é o seu corpo. Eu, sem tanto corpo a perder, sem alma suficiente para entrar num jogo para ganhar, vou ficando por aqui, certo de não ter passado da flor d’água: pelo menos, pode observar essa flor.

CHICO VIVAS

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quinta-feira, 30 de setembro de 2010

DIA DO TRADUTOR



Um dos irmãos Karamázovi – Ivã, provavelmente, o (mais) filósofo dos três: o caçula era “santinho” demais e o mais velho, bem puxado ao pai, não negando a ascendência, um quase néscio em pessoa, isso sem falar, porque à margem da família, como costuma acontecer nas melhores(?), do bastardo Smerdiákov – dizia que o erro dos empreiteiros da Torre, construtores do mito babélico, não estava na presunção, por si já enorme, seguida de perto, como se seu par associado, pelo orgulho da obra, antecipando-lhe o desejado resultado (não alcançado), não estava, em se partindo da terra, desse chão do qual partem sempre todas as construções, salvo aquelas que fincam suas fundações (firmemente) na imaginação, em se alçar a um céu restrito, em que só se é admitido sob oficial permissão, mas, ao contrário, numa experiência ainda de presunção e orgulho, embora talvez involuntária, trazer esse mesmo céu, descendo-o, com proporcional desvalorização no mercado, paraíso para poucos (escolhidos), para a terra.

Por conta disso – desconheço os cálculos, mas pelo porte da obra, deve ter consumido, além de esforços, humanas vidas perdidas, muito dinheiro -, acabou-se, sem que se falasse a mesma língua, pondo-se a perder todo o projeto, sonho então soterrado.

Hoje (e hoje nós continuamos a querer ora nos elevar, por métodos os mais diversos, aos céus, até acreditando que o meio mais eficiente é o de se controlar o que nos sai da própria boca, apelando-se, em alguns casos, mesmo para o (voto de) silêncio, ora a puxar para nossa companhia, no nível em que vivemos, esse mesmo céu) bastaria, como um atalho jamais imaginado, até por quem nunca teve os pés no chão, preferindo mantê-los nas mutáveis nuvens, um clique, e pronto: fala-se a língua que for; tem-se, imediatamente, sua devida(?) tradução.

Mas, tudo muito técnico, seguindo à risca uma sintaxe-padrão, tornando, por vezes, risível a semântica, quando apegados demasiadamente à norma, sem a maleabilidade que dá à língua múltiplos fios, não permitindo que seja apenas uma faca que só corta desse ou daquele lado.

E um bom tradutor não é aquele que se encerra em seus estudos, acumulando verbetes, enciclopédico, apesar do iluminismo do termo já ter perdido algo do seu brilho original de incontáveis volumes, mas o que, sem temor de perder prestígio social ou de sacrificar preciosas horas, que seriam, de outro modo, dedicadas ao seu exaustivo trabalho, circula pelas “bocas”, conhecendo, das palavras já sabidas, inusitados significados. Bom tradutor é o que resume frases tantas num parágrafo curto, sem, no entanto, suprimir-lhes o espírito, sem lhe retirar o encanto de nascença, não subtraindo ao leitor o verdadeiro prazer de ler, desde que consiga fazer isso a contento e não simplesmente para poupar tempo de trabalho, gastando-o, posteriormente, quase imediatamente, o fruto dessa poupança temporal, andando pelas bocas.

Igualmente merecedor de aplauso é o tradutor que, se não há outra alternativa, não hesita em construir um parágrafo e tanto a partir de uma frase quase solta, se só assim for possível, ao menos para sua boca em particular, bem (se) traduzir.

Como minha língua não conhece muitas bocas, minha homenagem a quem, frequentando sabe-se lá quantas, faz-me, da terra, subir aos Irmãos Karamázovi, com a sensação de que não tirei os pés do chão, desta terra ainda tão mal-traduzida, em que pese ler Dostoievski ser, não raro, uma viagem ao inferno (de cada um de nós).

CHICO VIVAS

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sábado, 25 de setembro de 2010

DIA DA TIA SOLTEIRONA


Isso é coisa do passado, logo dirão, até envolvendo essa lembrança num papel de preconceito injustificável – coisa, aliás, repetindo-se, do passado, como, se não disserem, hão de pensar.

A solteirona – e, aqui, não é significativo, em nome de uma igualdade de papéis, se falar em outro gênero -, agora, até já nutre certo orgulho de ser assim, com um rol de justificativas para esse seu estado, sublinhando, com pudor calculado, que sua solteirice longeva não se concerta, como em outros tempos, com uma castidade duradoura, chegando mesmo, já abandonando o cálculo, sem de todo esquecer o pudor (por puro cálculo), a deixar passar nas entrelinhas que prefere assim, afastados os compromissos, próxima, cada vez mais, do prazer.

E fala-se na carreira, nessa correria para se ganhar postos, elevando-se, tendo, às vezes, que “ficar no salto”, mostrando a que veio, ainda que use, na sequência, de toda sua atávica delicadeza, tirando proveito desse contraste, quando não para gerar algum mistério, não se revelando por inteiro, como um bom jogador que sabe blefar, seja para dar a impressão de que tem cartas na manga, quando está à beira de perder esse jogo, seja, fazendo cara de perdedor, a um passo da decisão, prestes a baixar as cartas, ganhar a partida.

Fala-se ainda nas restrições do “mercado”, já não se fazendo referência a postos de trabalho, mas ao dos pares, mesmo que não demonstre mais qualquer crença em platônicas junções, ideais encontros, felicidades lançadas para um sempre fantástico, não se podendo descartar a possibilidade de que, então, esteja-se em meio a uma grande jogada, no íntimo, acreditando que, depois de tanta espera, de tantas concessões, de tanto tempo arriscado, o que é seu, e só seu, está devidamente guardado, às vezes se desesperando por esse encontro não se dá de uma vez, até partindo, voluntariamente, voluntariosamente, ao seu encontro, embora preferisse que tudo se desse como em sua fantasia ao acaso.

Se tia por real parentesco, pouco importa. Tornam-se assim, ou se tornavam, quando isso tinha alguma importância, pela contagem do tempo, por uma solidão que não se mede pelas companhias, mesmo que agradáveis, mesmo que deem muito “prazer”, mas pela ausência de só uma, ainda que, com o tempo, deixe esta r prazer, tornando-se mesmo, em alguns casos, desagradáveis.

Isso é mesmo coisa de outros dias. E talvez, relativizando-se o gênero da tia solteirona – ter ganho um dia só seu não deve ser uma honra, um fato a ser comemorado, pelas luzes que, apesar do dia passar praticamente em branco, são jogadas sobre seu estado – eu esteja despertando, pela lembrança desnecessária, a desconfiança de que, perdendo tempo com isto, legisle em causa própria.

CHICO VIVAS

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