As associações – e creio que encontrarei parceiros nisso, como sócios da mesma ideia – são um recurso primário e eficiente de aprendizagem, desde aquela idade em que, vendo uma cabeça descoberta, estando um chapéu ao lado, observada antes a união entre ambos, acredita-se que nasceram um para o outro, até, como uma espécie de Doutor Pangloss (sem o saberem que são), não percebendo, eventualmente, por um pessimismo que contradiz a essência daquele doutor, esperançoso ao extremo, outra função para a cabeça, desprezando o raciocínio, embora tenham chegado a essa conclusão justamente por causa dele, atribuindo-lhe existência tão-somente como o suporte indispensável para o perfeito equilíbrio dos chapéus, por mais que estes tenham-se tornado anacrônicos, tanto quanto nos remeter a uma fábula(!) voltaireana (sem animais, senão o homem, e com muita moral: “Il faut cultiver notre jardin”) para falar de mundos possíveis, e entre estes o melhor de todos, quando otimismos são negociados a preço baixo, em diversas versões, tentando assim agradar a públicos variados, chegando a cobrar alto por um que é exatamente o mesmo que é vendido por uma ninharia, mas devidamente “rotulado” como produto de luxo, reserva para quem tem savoir vivre.
Uma das mais corriqueiras associações é a que estabelece um elo permanente entre o sorriso e a alegria (de viver) estampada no rosto. Lágrimas até têm o direito a uma polissemia que as faz ora tristeza incontestável, ora felicidade quase insuportável. Mas sorrisos não – não aparentemente. Porque sorrisos também doem. E nem falo daqueles que, como priapismo cuja aparência é de uma potência de sonho(s) – e nem preciso dizer de que gênero de sonhos –, sem, contudo, terem sido levantados sobre a base dos desejos, são sorrisos demasiadamente prolongados, exigência talvez das convenções sociais, artifício para nada dizer, quando não se tem mesmo nada para dizer, mantendo-se como mero espectador sorridente, à custa da quase dormência dos músculos da cara, sonhando estes já em adormecerem, relaxados, até fingindo uma tristeza como forma de ginástica facial.
É verdade que se sorri, feliz, por mais circunstancial que seja esse estado, com mais facilidade, sem maiores exigências, do que se chora por uma tristeza, a menos que esta seja consequência de uma dor ainda maior. Porém, sorrir por princípio, por se acreditar no sorriso como filosofia de uma vida, otimista não patológico, porque se crê que, mesmo quando as coisas não são um convite à alegria, deve-se, ainda assim, sorrir, cobra caro: e o preço alto disso é, sorrindo de tudo, como quem não concebe mais um mundo sem açúcar, com muito doce, não poder mais perceber as ricas nuanças da língua, como alguém que, não cogitando do valor gustativo do amargo (que isso seria incompreensível para os “doces”), renega, como definitivamente acre, aquilo que já não corresponde a um indiscutível atrativo para formigas.
Chorar é resultado de uma atividade fisiológica. Sorrir parece ser apenas um recurso primário e eficiente (mesmo quando já se conhecem outros) para se demonstrar alegrias em geral, embora possa ser usado, para quem sabe como lançar mão disso, como refinada arte – inclusive para (a de) viver.
CHICO VIVAS