Share

domingo, 7 de setembro de 2014

DIA DA INDEPENDÊNCIA




Quem (já) passou pela vida, tenha ou não vivido (como gostaria), talvez se “lembre” da Marquesa de Santos com a beleza madura de Glória Menezes, em Independência ou Morte, uma quase-vilã naquele filme-propaganda dos anos setenta. Os mais contemporâneos, embora, ainda assim, localizados no século passado, podem associá-la à beleza juvenil de Maitê Proença. De fato, no entanto, a se dar crédito a pesquisas historiográficas, Domitila de Castro Canto e Melo não era nenhuma Lady Di, estando mais para a “originalidade” britânica de uma Camila (Rosamaria Shand) Parker-Bowles: e isso, como se sabe, não impediu, ou impede, até onde parte dessa história ainda é tão presente, que elas tivessem devotados príncipes, com uma literalidade que dispensa aspas, tendo-os mesmo aos seus pés, quem sabe literalmente.



Não se esquece facilmente as (in)confidências, indignas de um bom mineiro, de Charles, desejando ser um OB só para partilhar, num exagero de invasão de privacidade, a intimidade de Camila. Pois Pedro, tão antes, “Demoñao” como por vezes assinava as cartas para Titília, lhe envia um mimo:



“[M]inha filha,

já que não posso arrancar meu coração para te mandar, recebe esses dois cabelos do meu bigode, que arranquei agora mesmo para te mandar”.



E Alberto Rangel, em nota para Cartas de Pedro I à Marquesa de Santos (Nova Fronteira), comenta: “Junto às cartas de dom Pedro, conservadas na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, existe um pacotinho de papel, encerrando cabelos de origem suspeita. Dessa vez seria o imperador menos avaro dos seus pêlos(sic) mais recônditos”. Enfim, um Pedro-pentelho!



Charles tinha, como sombra maior do que a que ele próprio é(ra) capaz de projetar, uma princesa cuja beleza a levava ao exagero de si mesma. Pedro, o que tinha? Uma Imperatriz Leopoldina que jamais, mantidos os padrões, seria destaque numa escola de samba, e cuja “originalidade” austríaca associada às infelicidades de um casamento de conveniência (e qual não é?) não animava os desejos de um príncipe com um ardor que só reforça a caricatura de sua latinidade morena.



“[R]emeto-te esses passarinhos que matei ontem e esses botões de rosas e abraços e beijos (Carta de 21 de outubro de 1827).



“[D]este seu amante constante e verdadeiro e que se derrete de gosto quando...com mecê,

O Fogo Foguinho

PS. Esta letra parece estar boa, mas mecê dirá à noite (Carta não datada)”.

CHICO VIVAS
Read rest of entry

domingo, 20 de julho de 2014

DIA DO AMIGO



Onde se escondem os tesouros? Eis aí (onde?) um mistério que permanece insondável – e é bom que seja assim, em que pese nosso desejo sempre recorrente por desencavar esperanças, não nos importando mesmo que, para isso, tenhamos que sujar as mãos, com uma literalidade que nos exime de culpas morais; é bom que assim seja porque desvendar tal mistério, encontrando os ditos tesouros, nos deixaria, pela falta do que continuar procurando, a ver navios onde navios realmente existem, abandonando o prazer de imaginá-los, afundados, cheios de tesouros a nossa espera, em lugares que nem nossa imaginação é capaz de precisar, sendo nela, talvez, ao menos para os que não creem mais em tanta fantasia (se imaginação e fantasia, saídas da mesma mente, não forem irmãs siamesas), em que se encontrem os (verdadeiros) tesouros.



Há uma quantidade de livros – alguns muito bons – de mistério. Entre esses, outros tantos em que o mistério é um tesouro que não se sabe, a princípio, onde está. Há um, em especial – fé à parte –, apesar do seu nome plural, cheio de Mistério: e a maiúscula serve para diferenciar os tesouros que esconde. Eis um, sem querer estragar (não aos spoilers!) a leitura, revelando o segredo: “Amigo fiel é proteção poderosa, e quem o encontrar, terá encontrado um tesouro”. (Eclesiástico, 6:14)



Em certa época, ao invés de escondidos sob o chão, como convém a um bom tesouro, pelo prazer (a mais) que se tem em se dizer que se o descobriu “depois de muito esforço”, ainda que tivessem bastado poucas cavucadas na terra e um raciocínio sem grandes piruetas da lógica dos mistérios, parecem brotar, espontaneamente, aos punhados, com aquela sem-cerimônia das flores comuns, para as quais, quem sabe se por serem tão comuns, e assim por existirem a mancheias, acabamos por não dar atenção, certos, com a certeza típica desses nossos tempos, de que estarão sempre ali, como se suplicando para que as colhamos, flores que são; para que os levemos conosco, amigos de plantão.



Chega uma hora em que desejamos uma flor (quando os mistérios já não nos interessam tanto ou os tesouros nos cobram, em tempo e imaginação, não dispondo mais tanto nem de um nem da outra, um preço maior do que seu valor real, depois de achado e convertido o tesouro: e mesmo as mais comuns, agora, por mais que as busquemos, surgem-nos(?) insondáveis). Que dizer, então, de um amigo?!



O prazer de (se ter) um amigo pode até começar pelo mistério que exala, por sua aparência de baú que contém um tesouro; passa por se abri-lo, manejando-se com cuidado seus fechos, ora pelo temor de forçá-lo em excesso, ora pelo medo de não se estar sendo, com a delicadeza necessária, firme o suficiente com o amigo; mas acaba, embora uma boa amizade não termine por aí, pelo encanto da simples descoberta.



E dizer o que há num amigo seria estragar, com revelação desnecessária, um mistério bíblico.

CHICO VIVAS
Read rest of entry
 
Related Posts with Thumbnails

Seguidores

My Blog List

Marcadores

Abrir o coração (1) Adulto (1) Ajuste de contas (1) Alfaiate (1) Alienação do trabalho (1) Alimentação (1) Alimento (1) Amante (1) Amigo (1) Amizade (2) Amor em cada porto (1) Anjo (1) Anjo exterminador (1) Anjo-da-guarda (1) Apertar o cinto (1) Aquiles (1) Arquitetura (1) Arrmesso de cigarro (1) Arte (1) Astronauta (1) Atriz (1) Bailarina (1) Balconista (1) Balzac (2) Banana (1) Barroco (1) Bernard Henri-Levy (1) Boa forma (1) Bolo de dinheiro (1) Bombeiro (1) Bondade (1) Botões (1) Brás Cubas (1) Cachorro sem dono (1) Caetano Veloso (1) Café (1) Café com açúcar (1) Café puro (1) Caminhos desconhecidos (1) Cão (1) Capadócia (1) Capadócio (1) Cara de anjo (1) Caridade (1) Carmem Miranda (1) Carta (1) Carta na manga (1) Cartão-postal (1) Cartas (1) Carteiro (1) Cartógrafo (1) Casados (1) Caso Dreyfuss (1) Cauby Peixoto (1) Cecília Meireles (1) Celulares (1) Chaplin (1) Chuva (1) Circo (2) Cliente (1) Coelho na cartola (1) Comida (1) Compositor (1) Compulsão (1) Construção (1) Consumo (1) Conteúdo adulto (1) Coração (1) Cordialidade (1) Coreografia (1) Corte-e-costura (1) Criação do mundo (1) Criatividade (1) Criativos (1) Cruz (1) Culto ao corpo (1) Cura (2) Cura da Aldeia (1) Dança (1) Datilografia (1) Datilógrafo (1) Democracia (1) Deus (1) Dia da Abolição da Escravatura (1) Dia da alimentação (1) Dia da amante (1) Dia da amizade (1) Dia da árvore (1) Dia da bailarina (1) Dia da banana (1) Dia da caridade (1) Dia da chuva (1) Dia da criança (1) Dia da criatividade (1) Dia da cruz (1) Dia da democracia (1) Dia da família (1) Dia da fotografia (1) Dia da infância (1) Dia da lembrança (1) Dia da liberdade de imprensa (1) Dia da Língua Portuguesa (1) Dia da mentira (1) Dia da pizza (1) Dia da Poesia (1) Dia da preguiça (1) Dia da propaganda (1) Dia da telefonista (1) Dia da tia solteirona (1) Dia da velocidade (1) Dia da vitória (1) Dia da voz (1) Dia das mães (3) Dia das saudações (1) Dia de Natal (1) Dia de Santo Antônio (1) Dia de São João (1) Dia de São Jorge (1) Dia do adulto (1) Dia do alfaiate (1) Dia do amigo (2) Dia do anjo-da-guarda (1) Dia do Arquiteto (1) Dia do artista plástico (1) Dia do astronauta (1) Dia do ator (1) Dia do balconista (1) Dia do bombeiro (1) Dia do café (1) Dia do cão (1) Dia do cardiologista (1) Dia do cartão-postal (1) Dia do carteiro (1) Dia do cartógrafo (1) Dia do circo (1) Dia do cliente (1) Dia do compositor (1) Dia do contador (1) Dia do datilógrafo (1) Dia do dinheiro (1) Dia do disco (1) Dia do encanador (1) Dia do escritor (2) Dia do esporte (1) Dia do estudante (1) Dia do filósofo (1) Dia do fotógrafo (1) Dia do goleiro. Dono da bola (1) Dia do intelectual (1) Dia do inventor (1) Dia do leitor (1) Dia do mágico (1) Dia do mar (1) Dia do marinheiro (1) Dia do Museólogo (1) Dia do nutricionista (1) Dia do órfão (1) Dia do palhaço (1) Dia do panificador (1) Dia do Pároco (1) Dia do pescador (1) Dia do poeta (1) Dia do pombo da paz (1) Dia do professor (1) Dia do profissional de Educação Física (1) Dia do silêncio (1) Dia do soldado (1) Dia do solteiro (1) Dia do sorriso (1) Dia do telefone (1) Dia do trabalho (2) Dia do tradutor (1) Dia do trigo (1) Dia do vendedor de livros (1) Dia do vidraceiro (1) Dia do vizinho (1) Dia dos Pais (1) Dia mundial do rock (1) Dia Universal de Deus (1) Dinheiro (1) Doença (1) Doistoiévski (1) Ecologia (1) Encanador (1) Enigmas (1) Entrando pelo cano. Desencanar (1) Escravo da palavra (1) Escrever (1) Escritor (2) Espécie em extinção (1) Esporte (1) Esquecimento (1) Estado civil (1) Eterno estudante (1) Família Desagregação familiar (1) Fardos (2) Fernando Pessoa (1) Filosofia (2) Filósofo (1) Florbela Espanca (1) Fogueira (1) Fogueira das Vaidades (1) Fome (1) Fonte dos desejos (1) Fotografia (1) Fotógrafo (1) França (1) Freguês (1) Ganhar o pão com o próprio suor (1) Gentiliza (1) Gianlorenzo Bernini (1) Gourmand (1) Gourmet (1) Graciliano Ramos (1) Grandes autores (1) Guerra (2) Guimarães Rosa (1) Hércules (1) Ideal de paz (1) Ideia pronta (1) Imaginação (1) Imprensa (1) Imprensa livre (1) Infância (2) Infância perdida (2) Ingmar Bergman (1) Intelectual (1) Invenção (1) Inventor (1) Irmãos Karamázovi (1) Isaurinha Garcia (1) Jardim das Cerejeiras (1) Jesus (1) Jogo de palavras (1) José (1) Juventude (1) Lado bom das coisas (1) Lágrima (1) Leitor (1) Lembrança (1) Ler a si mesmo (1) Letra e música (1) Levantamento de copo (1) Liberdade (2) Liberdade de expressão (1) Liberdade de pensamento (1) Língua (1) Língua Portuguesa (1) Livros (1) Loucura (1) Luta (1) Machado de Assis (1) Mãe (2) Magia (1) Mágico (1) Mal-traçadas linhas (1) Mania de perseguição (1) Mapas (1) Máquina de escrever (1) Mar (1) Marcel Proust (1) Maria (1) Marinheiro (1) Medicina (1) Médico (1) Médico de alma (1) Memória (1) Memórias (1) Mentira (1) Mesa (1) Metamorfose ambulante (1) Mistérios (1) Misticismo (1) Morte (1) Mundo da lua (1) Museu (1) Natal (1) Navegação (1) Navegação é preciso (1) Nêga (1) Negro (1) O Êxtase de Santa Tereza de Bernini (1) O Garoto (1) Órfão (1) Os doze trabalhos de Hércules (1) Pai (1) Palavras (1) Palhaço (1) Pão (2) Pão de cada dia (1) Paradoxo de Zenão (1) Pároco (1) Paz (1) Peito aberto (2) Pensamento (1) Pescador de homens (1) Pescador de ideia (1) Picco de la Mirandola (1) Pizza (1) Poesia (2) Poeta (1) Pombo da paz (1) Praga de mãe (1) Preço de banana (1) Preguiça (1) Professor (1) Propaganda (1) Propaganda é a alma do negócio (1) Psicologia (1) Razão (1) Realidade (1) Referências bíblicas (1) Religião (1) Rock (1) Rock and roll (1) Sabedoria (1) Saber (1) Santa Tereza de Ávila (1) Santo Antônio (1) São Jorge (1) São Miguel (1) São Paulo aos Coríntios (1) Satisfação (1) Saudação (1) Saudade (1) Shakespeare (1) Soldado (1) Solidão (1) Solteiro (1) Solteirona (1) Sorriso (1) Tântalo (1) Tcheckov (1) Telefone (1) Telefonista (1) Tempo (1) Tereza de Ávila (1) Tirania (1) Toques de celular (1) Torre de Babel (1) Trabalhador em teatro (1) Tradutor (1) Trigo (1) Trocadilho (1) Truque (1) Tudo acaba em pizza (1) Velhice (1) Velocidade (1) Vendedor (1) Vendedor de livros (1) Verdades (1) Victor Hugo. Oscar Wilde (1) Vida (1) Vida amarga (1) Vidraceiro (1) Vidro (1) Vizinhança (1) Vizinho (1)