Não vou, aqui, bancar o bonzinho. Bonzinhos, aliás, parece haver poucos, alguns mesmo, sabe-se lá com que intenções (devem ser boas, vindas de quem vêm), clamando por uma espécie de tombamento, deixando perceber, nas entrelinhas, que desejam ser “bancados”, sem que isso signifique que eles se fingem de bonzinhos, mas apenas que, reserva que creem ser necessária ao bom andamento do mundo, merecem, ao menos, ser sustentados, bastando que já são o que são, bonzinhos como são, quase um São Bonzinho, mesmo que entre os santos a bondade, de tão natural, não deva chamar a atenção.
Bons praticam bondade – e reconhecer isso não é, de minha parte, um ato bondoso. Mas, sendo assim, é como se os bons não pudessem ser outra coisa, senão a bondade em pessoa, nem sempre sendo assim por escolha própria, resultado de uma experiência de “maldades”, tendo chegando à conclusão de que mais vale a pena ser bom, que o mundo está precisando disso (até como uma maneira, nem sempre consciente, de se fazer necessário, em mundo tão despersonificado), e sim porque isso faz parte indissociável de sua natureza, através de um mecanismo que não compreende bem: o que pode lhe trazer aborrecimentos, considerando que não é certo que os bons sejam bem-vindos, inclusive porque sobre eles pesa, por vezes injustamente, a má reputação de serem desagradáveis com sua bondade explícita, com a defesa inflamada do seu jeito de ser, com a firme intenção de converter os maus.
O caridoso, muitas vezes confundido com bondosos em geral, é de outro gênero: o caridoso precisa reconhecer em alguém sua necessidade, não, rigorosamente, agindo com “prazer”, mas pela compreensão de que seu auxílio se faz preciso, naquela circunstância. O bondoso – como o Idiota do príncipe Michkin, de Dostoievski – busca as oportunidades, até com avidez, nem sempre com a descrição necessária para não deixar transparecer o incontrolável gozo em ser bom, mesmo à custa da desgraça dos outros, sem a qual ele (e sua bondade) não sobreviveria(m).
O bondoso, ainda que não o diga, flerta constantemente com a perfeição – e isso não tem a ver, necessariamente, com uma perspectiva teológica: a perfeição do homem na proporção direta em que se aproxima do seu Criador. Ainda que não afaste, mesmo numa experiência mundana, a “sombra” divina, o bondoso faz-se, como se discípulo de Protágoras, medida de todas as coisas; mais, dos outros homens, até não compreendendo, ou dizendo isso, a imperfeição (ou seja, a ausência de “sua” bondade, e não a própria maldade) nos demais.
Caridoso, o homem se liga, com essa virtude teologal, a Deus: o que não impede quem quer que seja de ser assim, mesmo que mantenha, ou diga manter qualquer divindade a uma razoável distancia laica. E ao fazer suas caridades não quer, como necessidade para a sua sobrevivência como tal, que prosperem(?) as infelicidades, desejando mais prósperas felicidades, mesmo que isso os torne dispensáveis.
CHICO VIVAS
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