A fogueira das Vaidades logo ficou conhecida, com sua fama correndo solta, como as cusparadas de fogo de um vulcão ladeira abaixo, alcançando, com rapidez que surpreende, lugares em que as Vaidades não eram conhecidas, ignoradas elas, apesar de isso as Vaidades não admitirem, fingindo ignorar o fato, deixando outras fogueiras de lado, como se os olhos agora se voltassem, preferencialmente, para aquelas, as das Vaidades, até porque estas não seguem, com rigor de culto, a tradição, ou com fidelidade religiosa um inflexível calendário, uma inamovível folhinha, por mais que pareça o contrário, ao se ver, dia a dia, uma folhinha, dessa árvore que se renova a cada ano, ser passada (para trás), movendo-se para o passado, por mais próxima que ainda esteja do (nosso) presente.
Percebendo a competição, e a vantagem clara (a claridade projetada pela própria fogueira permitia tal “esclarecimento”), as fogueiras, as que, aparentemente, até então, eram só o que eram, como se cumprissem um destino fatal (o de viverem para se consumirem, consumando-se o fado quando viram cinzas e não resta mais sequer um sopro cálido, calor pouco), pois elas partiram para o ataque sem, contudo, lançarem mão de um vocabulário belicoso, agindo assim menos por vaidade e mais por cálculo, por acreditarem – com ingenuidade que revela pouco conhecimento da psicologia humana ou com assombroso conhecimento de causa – que poderiam comer (o mercado das fogueiras) pelas beiradas, sem a avidez juvenil do fogo comum que, simplesmente, sai devorando tudo, sem um plano prévio, especialmente lançando suas chamas sobre aqueles que não viam com bons olhos o uso corrente das fogueiras feito pelas Vaidades, tomando-o como um desvio de rumo, prometendo, com fogo nos olhos, chispas disparadas de cara, como um conservador em campanha, um tradicionalista de palanque, mover céus e terra (sabe-se do que o fogo é capaz na terra, e teme-se aquele que pode vir dos céus) para que tudo volte a ser como era antes.
E como era antes?
A fogueira, um dia pagã, batizada, entrou de vez no templo sagrado, ainda que seu lugar de honra continue a ser o lado de fora, servindo não mais para comunicar, visualmente, o que as palavras demorariam bem mais para fazer, considerando-se a sabedoria, nada popular, que diz que a luz viaja mais rapidamente do que o som, e incomparavelmente mais do que um mensageiro de outrora, abrindo agora sua boca larga, perdida aquela função, para levar milhos, jovens e crus de experiência do mundo, para o fogo das grandes paixões, ao cúmulo do ardor, às vezes com inevitáveis assados.
Riem as Vaidades: Isso é coisa do passado! Se as fogueiras perderam sua função original, se a comunicação é instantânea (embora menos “mágica”, em que pesem certas tecnologias que se abeiram de um truque de ilusionismo, pela dificuldade em se acreditar no que fazem, a olhos vistos), se os milhos poder ser assados com mais rapidez, se jovens, ainda crus, preferem a onda das paixões-micro, fogueiras assim para quê?
Vaidades das vaidades, tudo é fogueira. Tudo é desculpa para se girar milhões (sem nenhuma espiga no espeto). “É” tudo “São” João – por mais que minha vaidade de ignorante letrado ache que frase assim soa errada, pode ter sido um acerto iluminado, mas pela fogueira, com tempo certo para se extinguir.
CHICO VIVAS
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