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quinta-feira, 9 de setembro de 2010

DIA DA VELOCIDADE


Sem querer ser um “futurista retrô”, essa coisa de velocidade é coisa do passado: já não faz muito sentido se pensar em velocidade, quando esta atropela a si própria, ultrapassando-se a cada segundo – para não falarmos, mais detalhadamente, naqueles milésimos, quase inacreditáveis na nossa matemática que já não anda bem nem mesmo com inteiros volumosos.

Um dia – como se, dizendo assim, desacelerássemos antes de engatarmos uma ré – pensava-se no futuro em termos de velocidade, assombrando-nos a possibilidade de, encurtando caminho, pouparmos tempo, isso porque o meio a nos levar daqui para acolá, tomando impulso, dispararia. Vendo, hoje, de revés, aquela perspectiva, ultrapassada sem que nos déssemos conta de estarmos então ficando para trás, por mais que nos mantivéssemos atualizados com as novas nomenclaturas que potencializam a rapidez, veloz sequer é mais a mais engenhosa imaginação, ainda que seja dela que saem, de uma ou de outra maneira, as “novas” velocidades.

É de fazer corar uma tartaruga, mesmo aquela, a do Paradoxo de Zenão, lenta, aos nossos olhos, como qualquer outra, porém, por força da lógica, não poderá jamais ser vencida numa corrida, nem mesmo por Aquiles, aquele mesmo, veloz como ele só.

Mesmo aqueles que a desdenham, alimentando fantasias – às vezes, compradas caro – de que é preciso pôr o pé no freio, que o mundo, veloz como vai, e vai assim não é de agora, está como está, querendo-se com isso se dizer que não chegou, afinal, a lugar nenhum, só agem assim em virtude da velocidade. Se levarem adiante a pretendida lentidão, hão de acabar por tomá-la como padrão e, mais à frente, quererão, achando-a já rápida demais, numa evidente contradição de termos, promover nova desaceleração, ou então se fatigarão, com velocidade impressionante, de vida tão lenta, dando a impressão de que o mundo parou, não gira mais, não indo, de qualquer modo, para lugar algum.

Apesar disso, extasiamo-nos com a velocidade. Nem tanto com a das máquinas, rapidez quase virtual, mas, sobretudo, com a do próprio homem, desses míticos corredores que sequer têm invulneráveis uma parte do corpo, parecendo, no todo, infensos aos vícios de uma humanidade mediana. E não é mesmo para se ficar “parado” diante de um homem, com seus músculos exigidos ao máximo, cortando o vento, rompendo limites, derrubando antigos obstáculos, mesmo quando se trata de uma prova de fundo, sem armadilhas no meio do caminho?!

Talvez, testemunhando a performance desses atletas “explosivos”, imaginemos que também nós, ainda que sedentários expectadores do esforço alheio, poderemos, como se tomados por uma velocidade figurada, pôr abaixo velhos limites, indo aonde nunca fôramos antes – e isso pode mesmo ser a casa do vizinho ao lado, tendo, até então, numa mera parede geminada um obstáculo intransponível, inclusive, mantendo a linguagem pouco literal, uma erguida com silêncio(s) e que requer, como martelo potente, não mais do que alguns “golpes de palavra(s)”.

Vendo-me agir assim, gastando tantas palavras, pode-se tomar a minha por uma veloz a precisar de um pouco de vagar, na forma de um silêncio salvador, ou se tomar estas minhas palavras tantas como o vagar em si, porque se fosse mesmo veloz uma vida assim, há muito eu já teria chegado em algum lugar: tempo perdido!

E tempo perdido é o combustível que move aqueles apressadinhos, loucos por velocidade, incapazes de compreenderem uma parada, mesmo que declaradamente provisória.

CHICO VIVAS

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