Vamos “malhar”?!
Não, isso já se tornou cansativo, embora seja o esporte preferido dos sedentários – e não apenas dos lassos de corpo, mas dos eternamente preguiçosos de espírito que se escoram em pensamentos repetidos, confiando em sua aparência sedutora de solidez a toda prova, como se se apoiassem num muro que é mera parede cai-não-cai, caída que estaria, se não fossem as escoras por trás, podres já: e se o fato de serem assim, repetidos, não lhes tira uma eventual verdade, pois há verdades, quando não desestimulam, por falta de prova em contrário, pela ausência de dúvida, que se interponha um contraditório que pode tanto reforçar sua validade (como verdade), quanto, tal qual se a podridão das escoras cedesse de uma vez, provocando, parede que já não se aguentava sozinha, a queda do muro, pô-la abaixo, restando dessa verdade só escombros, não sendo, porém, impossível que daí, entulho de fênix, possa algo ressurgir.
O culto da boa forma física, quando não “perdoável” pela busca da saúde (do próprio corpo), já se percebendo a má vontade para com a beleza, como se fosse algo “feio”, torna-se um ídolo de cabeça para baixo: mantido no altar, mas não para que se lhe imolem sacrifícios, e sim para que se o destrua, mas em termos, porque se isso fosse levado até as últimas consequências, se ficaria sem ter o que se malhar.
Que mal há, afinal, em se querer dar ao (próprio, diga-se) corpo a forma desejada, embora, não raro, se caia na armadilha de só desejá-lo assim por se crer que desse jeito ele se tornará um corpo desejado, quando, de tão “admirável” (neste nada novo mundo), pouco desejo desperta, atiçando até o culto por ele, mas fazendo-o ídolo do qual não se quer se aproximar demais, temendo-se, com tal aproximação, tirar-lhe algo do seu poder místico, mantendo-o, por mais perto, longe do alcance das mãos, estes membros que são a vanguarda do desejo, talvez sendo por isso mesmo tão “superiores”.
Os mais condescendentes dirão que mal, mal mesmo, só há quando essa busca não se dá pelo esforço continuado; quando, longo caminho à frente, prefere-se um atalho, com as sabidas consequências futuras (não existem mesmo consequências prévias) para esse corpo: o corpo é meu, ainda que assim não o seja por muito tempo, ou que por algum tempo seja assim, sendo, depois, bem diferente, por conta das (mesmas) tais consequências.
Quase tão extensa quanto a legião dos cultores do corpo, das hipertrofias sem a preocupação da simetria, num desequilíbrio que às vezes saltam aos olhos mais desavisados (hum, isso está me cheirando a velada tomada de posição), é a legião dos sedentários que, não podendo rebater, convenientemente, os atribuídos efeitos, graves, de não se mover uma palha (ou apenas isso), “malham” os outros, acreditando já ser isso esforço suficiente, autolouvando, em falso conflito, sua própria inteligência, como se esta estivesse na proporção inversa ao desejo que um belo corpo (malhado) desperta – a ponto de não se querer dormir tão cedo.
Despertai, ó invejosos!
Por falar nisso: que horas são? Acho que dormi demais. Obrigado por ter-me acordado.
Chico Vivas
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